quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Mata Baratas

O Corte horizontal, no corpo falecido, cheirava como o rastro de odor deixado pelas baratas ao passarem por um local abafado. É um cheiro que não se dispersa com pouco esforço e desinfetante. Mas, o agravante, é a asquerosidade que é criada por nossos parentes em relação ao inseto.

Eles, ao verem o animal, berram, enjoam e quebram as lampadas mais próximas com chineladas incertas. Eu me recordo bem que ao surgir um bixo desses na minha casa, era batata: Marília, corre aqui! - Eu era a menina mata-baratas.

Não havia, da minha parte, o menor horror àquela bixana, que ao ver o chinelo, corria como gato fugindo da vassourada do vizinho. Infelizmente sua rapidez era sempre previsivel; pobre barata tonta.

Quando a imagem do estômago começou a se formar, durante a cirurgia, eu não sentia mais o cheiro do esgoto. Três homens já estavam capotados no chão. As viceras de um homem tem mais poder de derrubar seus semelhantes do que aos ratos.

As baratas passeavam pelo recinto sem a menor preocupação, transitavam tranquilamente parecendo estar em casa, mas quando abusavam de nossa hospitalidade, subindo em nossas pernas, acabavam machucadas pelas pancadas dadas por nós com os sapatos de borracha.

Minha irmã tinha tentado me ensinar a sentir nojo de barata; ela sempre praguejava contra as criaturas, faltando somente cuspir no cadáver pretinho, que encolhia as patas sobre a barriga. Eu mantinha firme a minha convicção: jamais sentirei nojo ou desprezarei tais animais. Não foi exatamente como imaginei, mas acabei me acostumando com a presença de tais criaturas, afinal, é uma questão de sobrevivência.

Nesse ramo a palavra "nojo" é desprezada, com já exposto, e o seu significado emocional também. Você nunca sabe com quem está na sala, o próximo rim a ser comprado poderá ser o seu. Se mantenha de pé ou entre para a turma dos desaparecidos.

Na verdade, as baratas me animavam mais do que aquele penis branco que compunha o corpo falecido sobre a mesa cirurgica, caido entre as pernas do gay ingênuo, sufocado e espancado.

Ao olhar tal figura não pensei duas ou mais vezes, logo peguei uma barata, pelo casco, a coloquei abaixo da minha bota e pisei levemente sobre seu corpo. A coloquei sobre o penis branco como roupa, para esconder os atributos mais enojadores de um ser humano do genêro masculino.

Agora está melhor, prefiro as baratas ao inves de me deparar com o vestígio dos homens. Acho que seria grande prazer penetrar uma barata na minha vagina, suas patas se rebateriam e fariam coceguinhas nas paredes viscosas, e o procurar desesperado do bixano por uma saída aumentaria mais a vibração no local, o que me faria gozar facilmente.

Pense mulher, é melhor algumas patinhas sapecando suas paredes aquele infernal cilindro pulsante que somente vislumbra um gozar transcendental.

English:


The horizontal cut, in the corps, smelled like the odor that cockroaches left when pass through a closed space. Is a type of smell which does not disperse easily, even if you put a lot of effort and disinfectant.

But the most aggravating thing is the sense of repulsiveness that our parents build up around the insect.

Upon seeing the insect, they bellow, nauseated, and break the closest lamp with misfired slippers.  I remember well that when one of these creatures would appear in my house, one thing was for sure: Marília, come here!  I was the Girl Who Slayed Cockroaches.

I, for one, had not the slightest fear of those little guys, who, seeing my slipper, scattered like cats fleeing from the neighbor’s broom.  Unfortunately, their course of action was always predictable; poor naïve cockroach.

When the image of the stomach started to reveal itself during the surgery, I no longer noticed the smell of the sewer.  Three men had already fainted, on the floor:  the organs of a man have more power to defeat his peers than do rats.

The roaches ranged the space without worry, wandered calmly as if they were at home, but when they abused our hospitality, climbing up our legs, they ended up getting slapped with our rubber shoes.

My sister had tried to instill in me the sense of cockroach nausea; she always swore at them, failing only to spit on the little black cadaver, which closed its legs over its stomach.  I firmly maintained my conviction: I would never feel sick from or disparage such animals.  It wasn’t exactly as I had imagined, but I accustomed myself to the presence of these creatures, which is, ultimately, a question of survival.

In this field, the word ‘nausea’ is disparaged, as already mentioned—and its emotional significance as well.  You never know who you’re in the room with; the next kidney to be bought could very well be yours.  Stay on your feet or enter into the ranks of the disappeared.

In truth, the cockroaches turned me on more than that white penis that constitutes the lifeless body on the operating table, fallen between the legs of the gay naive, suffocated and beaten.

Upon seeing that figure I didn’t think twice—I picked up a roach by the shell, put him under my boot and stepped heavily on his body.  This I draped over the white penis as if it were clothing, to hide the most nauseating attributes of being a human male.

Now it’s better.  I prefer the cockroaches to encountering the residue of men.  I think there would be great pleasure in penetrating myself with a cockroach, its little feet kicking against and tickling the viscous walls, and its desperate search for a way out would only increase the vibration, which would easily make me come. 

Think, woman: it’s better to have those tiny paws tickling your walls than the infernal cylinder, pulsating, that only seeks a transcendental orgasm. 

O cão

Como depressivo se propõe o mundo quando um cão manobra cinco vezes para conseguir eliminar sua aguá excedente em um habitat que mede um metro quadrado.  
 
O animal rouba a arte de manobrar para extirpar de seu corpo a vontade de jorrar seu ser viril sobre um pedaço de terra inexistente dentro da selva de pedra, onde este se perde diante da impossibilidade de mijar e cavocar a terra para que a expressão de seu organismo se unifique ao terreno.  
 
Unido está o cão com o mármore do edifício de luxo quando, após usufruir do sanitário diminuto, tenta afiar as suas garras no solo hostilizado por um ser que impossibilita todas as suas vontades de ser o que a natureza lhe propõe: o instinto. O ser humano rouba a essência dos outros animais, que felizes vivem, e se aproveitam daquilo que é mais precioso: o dom que a vida pode lhes dar; o não pensamento sobre a ação. 
 
Humaniza tanto o homem que judia dos animais, invejando o poder que este se proibiu: sentir o vento, o frio e a vontade. Se proibiu a permissão, e identifica-se o ser humano em qualquer frente em que se perceba a frieza da racionalidade. 
 
Transforma-se o ser natural em coisa separatista, em ser distante, extrafísico, enquanto todos gritam pelo "poder latir", assim como os cachorros. Seus chefes, que se condenam ao inferno por exploração de seus iguais, não dormem e tentam, hoje, fazer a dor de seus subordinados a mais diminuta possível. Tudo para deitar seus cérebros pensantes em travesseiros da Nasa, e justificar, por falta de doação, a demissão de mais um daqueles que, outrora, lhe trouxeram sorte. 
 
Nobres aqueles que ao se encontrarem em seu casulo de tijolos deparam-se com um sentimento nu, algo que os faça sentir-se animais, suficientemente, para jorrar à vontade, na porcelana, aquilo que guardaram em seus intestinos quilométricos. 
 
Nada tem a se adquirir com um ser que geme quando, impossibilitado de latir, expressa suas entranhas, que trava ao perceber mais uma impossibilidade de sentir-se vivo. Depressão é simples como uma molécula que nada expressa: o infarto é o próprio ser humano, em sua prisão inventada, ao se subordinar.  
 
O bêbado, em conjunto com um enrolado de ervas, tenta gritar e ter legitimidade diante de tanto esconderijo. De nada se difere o homem da barata, ambos fogem acanhados daquilo que não têm possibilidade de enxergar ao levantarem o pescoço. Somente fogem, ambos, ao escutar passos mais fortes do que aqueles que podem acuar.  
 
De tristeza solitária vive aquele que enxerga tais fatos e difamados são os perceptíveis, aqueles que se permitem sentir compaixão e compreensão sobre aqueles que vivem a mais... 
 
Socorro, gritam os observadores!!! Socorro, gritou Dostoiévski. Tristeza, grito eu, tentando adequar-me, de tristeza gritarão aqueles que virão: que meus irmãos não sintam o cheiro do couro cru em Nova Andradina.  
 
Que em Marília não se permita a queimada, que em tal cidade não exista mais o negro da fumaça da destruição, para que o ser humano consiga esquecer por um minuto aquilo que ele se tornou: a mentira, a fuligem, a inexistência flutuada, caída na estrada e atropelada por caminhões que levam a felicidade aos que não existem mais.

Para Ele, que não se interessa.

A água escorre pelo corpo da mulher nua, que massageia lentamente seus
seios. Ela parece conversar com alguém, mas só está sonhando com o encontro
com ele, treinando, inventando frases decoradas, para se caso um dia
ocorrer, ela não gagueje, como sempre acontece.

Depois do banho ensaia as expressões faciais, o modo de tirar os óculos,
o movimento das sobrancelhas. Se olha no espelho e atrás do seu rosto
refletido vê ele, com sua boina de tecido "caipira". Seu coração dispara
quando percebe seu sonho sem realização, seus órgãos começam a se comprimir,
ela sente ânsia.

Quando chega em seu quarto, nua, deita na cama retirando o cobertor e
desliza a mão sobre suas coxas, que ardem. Ela se toca e tenta esquecer
aquele desejo oprimido, ou supri-lo da maneira possível, mas seu corpo ainda
o quer.

A emoção da boca e da barba raspando em sua vagina só da mais dor
àquela solidão, a imaginação faz com que ele a toque, e ela o sinta, mas ao
abrir os olhos o aperto rasga seu peito e ela começa a chorar. O espasmo que
ele a faz sentir dói ao acabar, quando ela o procura na cama. Aquele dedo,
com as lagrimas do desejo, do prazer, limpam depois as lagrimas que
escorregam de seus olhos, que rodeiam o quarto onde nada ela vê.

E para ele, que não se interessa, ela quer contar, quer ver, agarrar,
beijar e gritar de tesão, de amor, em qualquer lugar, com ele. Mas a
realidade explode seus sonhos com a frase dita na escola, que ela recorda: A gente se fala.

Ele partiu da sala, desceu as escadas com ela; aquilo era um adeus, e falou a frase.
Ela, depois, correu para o banheiro do corredor, não
conseguia conter seu desespero.

A vantagem: A lembrança e o desejo de lhe amar só a toca de vez em
quando, e quando isso ocorre, muita água é gasta no banho, a conversa não
tem fim.
Diario de uma adolescente apaixonada por um professor.